terça-feira, 3 de agosto de 2010

Entrevista

Nunca escrevi no blog algo a respeito da minha vida e do meu filho e da minha luta com a alergia alimentar. Mas resolvi agora por um tom mais pessoal nas postagens.

Recebi há um tempo um convite para dar uma entrevista em um jornal de uma Universidade daqui de Salvador. Não consegui enviar a entrevista em tempo hábil e por isso não foi publicada. Acreditem mas sou mãe, mulher, profissional e ainda presidente da ABAPAA.

Muitas vezes demoro em imprimir um certificado, produzir um novo evento, pois não tenho tempo ou dinheiro. Todos os custos da ABAPAA são bancados por mim! Mas com certeza nenhuma família que busca auxílio na Associação demora em receber uma resposta.

Agora estamos iniciando uma nova fase. A ABAPAA está se profissionalizando, vai ficar mais organizada, temos várias idéias a implantar. Mas sozinha não vou conseguir fazer tudo!

Fica aqui o convite: quer participar ativamente da ABAPAA? Fazer parte dessa história? Construir uma realidade diferente para quem tem alergia alimentar?

Então, é só entrar em contato!

Agora deixo a leitura de parte da entrevista, na próxima postagem o restante:



Primeiro gostaria de agradecer o convite. Sinto-me lisonjeada em poder contribuir para o Jornal e assim também divulgar a alergia alimentar e a ABAPAA.

Sou fisioterapeuta formada pela UCSal, especialista em terapia intensiva pela USP e fisiologia do exercício pela UNIFESP e atualmente estudo nutrição. Trabalho na docência há mais de três anos como professora de Anatomia Humana e fui supervisora de estágio do curso de fisioterapia da UCSal na disciplina estágio supervisionado em clínica médica II – emergência.

Tenho 31 anos e sou mãe de Lucas, uma criança que tem alergia alimentar múltipla.

Antes de ser mãe eu sequer imaginava existir alergia alimentar nesse nível, para falar a verdade não sabia que a alergia à proteína do leite de vaca era possível. Pensava que alergia alimentar era não poder comer camarão na idade adulta e então não se comia esse alimento e tudo bem. Simples e fácil!

Meu filho foi exposto à proteína do leite de vaca precocemente, ainda na maternidade ofereceram fórmula infantil (apesar de eu ter muito colostro) e ainda no hospital ele começou a apresentar sintomas. Eu amamentei exclusivamente por seis meses, porém me alimentava com leite de vaca e a proteína passa para o leite materno (algumas crianças muito sensíveis reagem dessa maneira por isso a recomendação é a mãe fazer dieta de restrição alimentar). Essa é a combinação da alergia: exposição precoce associada à susceptibilidade genética.

Aliado a isso, a jornada até encontrar um médico que entendesse realmente de alergia alimentar foi permeada por sucessivos erros terapêuticos como introduções alimentares inadequadas por exemplo.

Isso sem falar na luta pela fórmula a base de aminoácidos livres que ele utiliza. Pode custar até R$500,00 uma lata de 400g, inviável para mim e acredito que para a maioria da população brasileira. Dispor de no mínimo R$ 5.000,00 por mês somente com latas de fórmulas é complicado, não acha? Hoje recebo as fórmulas pela prefeitura de Salvador mas tive que pagar durante um bom tempo até entrar no programa de dispensação.

Enfim, por isso tudo organizei a ABAPAA. Para divulgar que a alergia alimentar existe, que o diagnóstico e o manejo são difíceis sim e que precisamos de profissionais competentes nessa área. Com o objetivo de ajudar as famílias, informando-as para que não passem pelo que passei, ou ao menos, passem com apoio e não sozinhas “batendo a cabeça”.

1 – O que precisamos saber sobre alergia alimentar? O que é?

A alergia alimentar é uma reação adversa a alimentos envolvendo mecanismos imunológicos. A fração do alimento capaz de desencadear a alergia é a proteína. Em palavras mais simples, o corpo identifica a proteína do alimento como algo nocivo e ativa o sistema imune que por sua vez desencadeia uma série de reações com o objetivo de “destruir o inimigo”, inclusive com a produção de anticorpos.

O modelo de estudo mais utilizado pela ciência é a alergia à proteína do leite de vaca (APLV) por isso quando se fala em alergia alimentar o que se escuta e se lê nos artigos é a respeito da APLV. Mas sabe-se que cerca de 90% das reações são causadas por um grupo de oito alimentos: leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, castanhas, peixes e frutos do mar. Vale ressaltar, entretanto que qualquer alimento pode causar reações de hipersensibilidade.

Não podemos também exagerar e creditar qualquer reação à alergia alimentar. Existe uma gama de reações adversas a alimentos com sintomas parecidos sem a dependência do sistema imunológico, como as reações tóxicas e as intolerâncias. O caso mais comum de confusão é a intolerância à lactose, uma doença diferente da APLV com tratamento e prognóstico diferenciado também. A intolerância à lactose é a dificuldade em realizar a digestão do açúcar do leite (lactose) por falta da enzima responsável. Não existe alergia à lactose!

2 – Como se manifestam as alergias alimentares? (crises/sintomas)

Os sintomas da alergia alimentar dependem do mecanismo imunológico envolvido. A sintomatologia é vasta, acomete diversos órgãos, principalmente os sistemas digestivo e respiratório, e a pele. Entre os sintomas mais comuns temos: diarréia, vômitos, sangue nas fezes, urticária, edema de olhos e boca, crises de asma, reações anafiláticas, déficit de crescimento e desenvolvimento, choro, cólicas, irritabilidade e prisão de ventre.

A alergia alimentar é classificada quanto ao mecanismo imunológico em reações mediadas por imunoglobulina do tipo E (IgE) que apresentam sintomas imediatos, logo após a ingestão do alimento (entre 20 minutos a duas horas após); reações não mediadas por IgE que apresentam sintomas tardios (até quatro dias após a ingestão do alimento) e reações mistas, que apresentam sintomas comuns às outras duas classificações.

3- O que leva um organismo a reagir de forma tão exagerada e desastrosa?

Segundo o Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2007, para que tenhamos o surgimento da alergia alimentar observamos uma junção de fatores: a predisposição genética do indivíduo, uma dieta com proteínas com capacidade alergênica e a quebra dos mecanismos de defesa do trato gastrointestinal.

O sistema gastrointestinal de um recém-nascido ainda é imaturo bem como o sistema imunológico. Quando se associa essas características à exposição precoce (antes dos seis meses de vida) a uma proteína com alta capacidade alergênica em uma criança com fator de risco genético para alergia, o corpo pode então reagir e determina-se uma alergia alimentar.

Podemos predizer as crianças com risco em desenvolver alergia alimentar quando levantamos a história familiar de atopia. Filhos de pais alérgicos (independente se alimentares ou não) ou se um dos pais ou irmão é atópico são considerados crianças com potencial de risco para alergia e deve-se redobrar o cuidado na exposição a alérgenos alimentares.

4- Qual o caráter das substâncias que costumam desenvolver alergias?

Os alérgenos são proteínas, normalmente glicoproteínas de alto peso molecular.

5- Diagnostico e tratamento.

Um dos grandes problemas enfrentados pelos portadores de alergia alimentar reside no diagnóstico. Em um trabalho científico publicado em 2007 foi constatado que o tempo médio que os lactentes ficam sem diagnóstico é de 108 dias. Eu, particularmente, fiquei literalmente pulando de médico em médico por cinco meses (150 dias) com meu filho sem diagnóstico, perdendo peso com vômitos, diarréia e dermatite.

O diagnóstico é difícil, pois não existe um exame específico que feito confirme a suspeita da alergia alimentar. Ele é todo baseado na história clínica do paciente. O único teste realmente fidedigno para se estabelecer o diagnóstico é o teste de provocação oral (oferecer o alimento suspeito sob supervisão médica e avaliar os sintomas).

Em resumo, para se diagnosticar alergia alimentar deve-se valer de três pontos fundamentais: suspeita diagnóstica de acordo com as manifestações clínicas; exclusão da dieta do alérgeno em questão com desaparecimento dos sintomas e teste de desencadeamento oral positivo confirmando o diagnóstico.

O que tenho percebido com a ABAPAA é ou uma demora no diagnóstico (até mesmo sem diagnosticar crianças realmente com alergia alimentar) ou um grande exagero, com diagnósticos errados impondo deitas restritivas em crianças sem alergia. Lembrando que o diagnóstico deve sempre ser feito por um médico especialista!

Em relação ao tratamento existem atualmente várias linhas de pesquisa mas até hoje a única terapêutica comprovada que promove a cura da alergia é a dieta de restrição alimentar. Deve-se retirar da dieta o alimento ou alimentos envolvidos. A dieta tem que ser completa, total, pois a alergia é qualitativa e não quantitativa. Isso inclui a preocupação com a contaminação cruzada e os traços dos alérgenos (contaminação do alimento normalmente quando é feito em um mesmo maquinário onde se produzem outros alimentos, mesmo que haja a limpeza da máquina podem ficar algumas proteínas e eles acabam adquirindo quantidades mínimas mas suficientes para desencadear alergia).

É prioritário manter o aleitamento materno exclusivo por seis meses e manter a amamentação prolongada (por pelo menos dois anos ou mais), segundo recomendação da OMS. E em muitos casos a mãe deve amamentar em dieta de restrição também! A princípio apenas restringir as proteínas do leite de vaca mas a casos da necessidade de restrição de ovo, soja, carne, etc.

Se não houver condições da manutenção da amamentação utilizam-se as fórmulas especiais, os hidrolisados protéicos ou as fórmulas a base aminoácidos livres, que devem ser escolhidos pelo pediatra e/ou nutricionista que acompanha a criança.

Deixando bem claro que o que cura a alergia é a dieta de restrição e não o uso de fórmulas especiais. Estas são utilizadas se não for possível a amamentação. Caso a mãe ainda amamente deve-se estimular essa conduta.

Um comentário:

  1. Olá Bianca, gostaria que vc me orientasse de que forma posso conseguir entrar no programa municipal de dispensação. Minha filha, hj com 5 meses, tem alergia à proteína do leite de vaca, por isso faz uso de um leite chamado PREGOMIN. Não tenho conseguido encontrar médico do SUS para emitir um relatório, atestando esse problema alérgico. Preciso de ajuda para entrar nesse programa municipal, uma lata de PREGOMIN, que custa 125 reais, não dura uma semana! Por favor, me escreva: marcelmagalha@hotmail.com

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