segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Carnaval de Barriga Vazia

Prefeitura inicia tradição nos meses que antecedem o carnaval, limitando distribuição de alimentação especial para crianças com alergia alimentar.

Está virando tradição a Prefeitura de Salvador, no mês que antecede o carnaval, limitar a distribuição da fórmula, à base de aminoácidos livres, único meio de alimentação para aquelas que possuem alergia alimentar.

Desespero – Bianca Gouveia, mãe de Lucas e presidente da Abappa, se sente humilhada em relação à situação, além de ter que contornar transtornos para complementar a alimentação de Lucas. “Todo carnaval é isso. Eles dizem que não tem dinheiro. Que a verba não deu para comprar as latas de todos que fazem parte do programa. Então, eles ratearam a quantidade que tem entre as mães. Eu ainda dou sorte, pois só me tiraram uma lata das nove que recebo. Só que Lucas está precisando de 11 latas e nós só recebemos oito. Além disso, eles queriam marcar a próxima consulta de meu filho para o dia 18 de março. Mais de um mês entre as consultas! Perdi o controle e depois de muito discutir, consegui que marcassem para o dia 10 de março. Mas a nutricionista já me disse que eu vou até lá no dia 10, mas não existirão novas latas da fórmula por causa do carnaval!”

Direito assegurado - Problemas com o fornecimento das fórmulas vêem se tornando rotina na capital baiana. No final do ano de 2009, a Prefeitura Municipal do Salvador suspendeu a distribuição das latas às famílias das crianças portadoras de alergia, alegando problemas na licitação. Segundo Gouveia, presidente da Abapaa, as crianças que se alimentam exclusivamente dessa fórmula usam em média 15 unidades por mês. “A redução que tentaram implementar na época seria considerável, um total de cinco latas por família”, explica. Graças a ação da Abapaa, junto aos meios de comunicação, a situação foi regularizada em tempo de não causar problemas mais graves.

Contudo, o problema vai além das ações da Abapaa. Segundo a advogada especialista, Marina Basile (BCM advogados), não existe lei especifica para o caso. “O que é preciso entender é que a Constituição Federal de 1988 reservou um lugar de destaque para a saúde, tratando-a, de modo inédito no constitucionalismo pátrio, como um verdadeiro direito fundamental e estabelecendo, no art. 196, que ela é direito de todos e dever do Estado”. Dessa forma, segundo Basile, o Estado deve garantir, “mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, explica.

A advogada ressalta ainda que, desse modo, dentro da chamada "reserva do possível", o cumprimento dos direitos sociais pelo Poder Público pode ser exigido judicialmente, “cabendo ao Judiciário, diante da inércia governamental na realização de um dever imposto, constitucionalmente, proporcionar as medidas necessárias ao cumprimento do direito fundamental em jogo, com vistas à máxima efetividade da Constituição.


Dever do Estado - Basile acredita que se tem entendido, de forma quase pacífica na jurisprudência, que o direito à saúde, confere ao seu titular (ou seja, a todos) a pretensão de exigir diretamente do Estado que providencie os meios materiais para o gozo desse direito, como, por exemplo, o fornecimento da fórmula em questão, até quando for necessário, de acordo com o relatório médico. “As alegações de negativa de efetivação de um direito social com base no argumento da reserva do possível deve ser sempre analisada com desconfiança. Não basta simplesmente alegar que não há possibilidades financeiras de se cumprir a ordem judicial; é preciso demonstrá-la”, dia a advogada.


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